“Massacre de velhos”. Na Itália, é preciso escolher quem vive e quem deixar morrer

Publicado por: Editor Feed News
11/03/2020 13:31:45
Exibições: 214
Courtesy Pixabay
Courtesy Pixabay

Hospitais saturados de doentes e uma onda de contágio que não termina. A epidemia do novo coronavírus está a abalar Itália, um país onde mais de 60 milhões de pessoas estão de quarentena. Nos hospitais, os médicos actuam como numa zona de guerra, fazendo escolhas quanto a quem salvar e há quem denuncie um “massacre de velhos”.

 
 

A decisão do Governo de Itália de colocar todo o país de quarentena surgiu demasiado tarde, segundo alguns italianos. O país tem mais de 8 mil infectados e já morreram mais de 600 pessoas devido ao Covid-19. Os novos casos de doentes com coronavírus continuam a aumentar e os hospitais estão a rebentar pelas costuras, saturados de pacientes e com falta de camas para acolherem mais.

 

Na pior zona do surto, na região da Lombardia, onde fica Milão, os médicos actuam como numa guerra, tendo que decidir quem socorrer e quem deixar morrer com base nas capacidades de sobrevivência de cada doente. Este é o cenário traçado por um anestesista do Hospital Juan XIII de Bergamo, localidade situada a poucos quilómetros de Milão, em declarações ao jornal italiano Corriere della Sera.

 

“Todos os dias temos que decidir quem salvar”, refere Christian Salaroli, de 48 anos, frisando que os médicos não podem “fazer milagres”. Assim, os mais velhos e as pessoas que têm maiores problemas de saúde estarão a ser excluídos dos tratamentos nas Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) porque é preciso curar quem tem mais possibilidades de sobreviver e de viver mais tempo.

 

“Além da idade e do quadro geral”, “o terceiro elemento” que contribui para a recuperação “é a capacidade do paciente de se recuperar de uma operação de terapia intensiva“, acrescenta o anestesista.

 

Doentes mais afectados “ficam sem oxigénio”

 

Salaroli revela que os pacientes com Covid-19 que apresentam insuficiência respiratória são internados na UCI sob “ventilação não invasiva”.

 

O médico também revela que a penumonia provocada pelo Covid-19 é “intersticial, uma forma muito agressiva que afecta a oxigenação do sangue”. “Os pacientes mais afectados tornam-se hipóxicos, ou seja, ficam sem quantidades suficientes de oxigénio no organismo”, esclarece.

 

“Os pacientes que têm patologias cardio-respiratórias graves e pessoas com problemas graves de artérias coronárias são cuidadosamente avaliados, porque toleram mal a hipoxia aguda e têm poucas hipóteses de sobreviver à fase crítica”, analisa ainda Salaroli.

 

“Se uma pessoa entre 80 e 95 tiver insuficiência respiratória grave, provavelmente não sobreviverá. Se tiver uma falha multi-orgânica de mais de três órgãos vitais, significa que tem uma taxa de mortalidade de cem por cento“, acrescenta.

 

A situação é tão dramática que há quem fale num “massacre de velhos”, algo que o Governo nega, mas que é corroborado por diversos especialistas. Nos média, há notícias que indicam que já haverá hospitais que não aceitam pessoas com mais de 60 anos nas UCI.

 

Salaroli que tem dois filhos diz que, para já, ainda consegue dormir à noite. “Eu sei que a escolha é baseada na suposição de que alguém, quase sempre mais jovem, tem mais hipóteses de sobreviver do que o outro. Pelo menos, é um consolo”, sustenta.

 

Mas o anestesista assume que a situação é dramática também para os profissionais. “Não é apenas a carga de trabalho, mas a emocional, que é devastadora“, diz.

 

Este profissional de saúde também aconselha os italianos a cumprirem à risca a quarentena. “Fiquem em casa. Fiquem em casa. Não me canso de repetir. Vejo muitas pessoas na rua. A melhor resposta para este vírus não é andar por aí. Não imaginam o que está a acontecer aqui. Fiquem em casa”, sublinha.

 

Actor de “Gomorra” acusa autoridades após morte da irmã

 

Entretanto, o actor italiano Luca Franzese que participou na série “Gomorra” divulgou um vídeo nas redes sociais, com fortes críticas às autoridades italianas. Ele aparece ao lado da irmã que terá morrido com coronavírus a lamentar que, apesar de ser epiléptica e de pertencer a um grupo de risco, ela não foi socorrida.

 

O diagnóstico de coronavírus só terá sido feito depois da morte da irmã. O actor revela que ainda lhe fez respiração boca-a-boca, para a tentar salvar, pelo que se colocou em auto-isolamento na casa de família em Nápoles, para evitar contagiar outras pessoas porque também ele pode ter o vírus.

 

Sistema de Saúde em colapso

Não há ainda uma explicação para o facto de Itália ser o segundo país do mundo com mais casos de infectados por Covid-19, logo a seguir à China, onde terá tido origem o vírus.

 

“paciente zero” que terá originado o surto em Itália ainda não foi identificado, mas o “paciente 1” está a revelar melhorias. Matti, gestor da empresa Unilever, de 38 anos, esteve às portas da morte em Fevereiro, mas já saiu da UCI e começou a respirar sem ajuda nos últimos dias. Antes de lhe ter sido diagnosticado o coronavírus, terá infectado várias pessoas num centro de saúde onde se deslocou e infectou também a namorada grávida.

 

O vírus foi-se espalhando, com um dos principais focos a ser na zona de Milão que é considerada uma das mais ricas de Itália, com as melhores condições financeiras e sanitárias. Também é uma das zonas que movimenta mais pessoas por aí residir o principal sector produtivo do país.

 

A epidemia está a abalar o Serviço de Saúde público italiano perante tantos doentes hospitalizados. A situação está também a afectar o atendimento médico a outros casos que podem demorar muito mais tempo do que o habitual e do que o que seria recomendado.

 

Há quem aponte o desinvestimento feito pelos sucessivos Governos italianos no Serviço de Saúde Nacional como a raiz dos problemas, devido à perda de recursos humanos e materiais, designadamente quanto a números de camas disponíveis para os doentes.

 

Fonte: SV, ZAP //

Imagens de notícias

Tags:

Compartilhar

Vídeos relacionados

Comentários